quarta-feira, 10 de março de 2010

Entrevista com a Provedora da Santa Casa da Misericórdia de Albufeira, Maria Helena Santos Serra

  Maria Helena David de Abreu dos Santos Serra nasceu no Huambo (Angola), há 79 anos. Casada, é mãe de sete filhos. Aos sete anos, juntamente com os irmãos, partiu para Portugal para poder continuar os estudos. Frequentou o 1.º ano, do curso de Românicas, na Universidade de Coimbra. Após o 25 de Abril de 74, foi tesoureira da Junta de Freguesia de Albufeira e vereadora com atribuição da vice-presidência da Câmara Municipal de Albufeira, durante seis meses. Actualmente é Provedora da Santa Casa da Misericórdia de Albufeira.


Entre Vistas - Quando é que iniciou funções como provedora na Santa Casa de Albufeira?
Maria Helena Serra – Há 32 anos, no dia 28 de Maio.
Entre Vistas - Quais são as funções de um provedor?
Maria Helena Serra – As funções de Provedor são supervisionar toda a instituição, tentar dar um bom ambiente de trabalho a quem nela labuta, receber todos os que nos procuram e tentar remediar os males que nos são propostos. Numa Misericórdia ninguém nos procura para nos dizer que lhe saiu a sorte grande ou que vive muito feliz. Quem nos procura são pessoas que têm algum sofrimento ou alguma carência. Nós procuramos ser a resposta para todos os problemas humanos que nos apareçam.
Entre Vistas - Quais são as actividades realizadas pela Santa Casa da Misericórdia de Albufeira?
Maria Helena Serra – São muitas…vão sendo realizadas graças ao esforço da provedora e de todos os elementos que aqui colaboram, e que são muitos, vão podendo responder. Temos um lar de 3.ª idade, um lar de jovens, um lar da 1.ª Infância, um lar para doentes mentais, em Paderne, o lar de S. Vicente para doentes debilitados fisicamente e mentalmente, a creche-infantário da Guia, a creche-infantário Quinta dos Pardais, a creche-infantário Arco-Íris, a Casa da Esperança, para doentes de SIDA e os sem abrigo, a Casa da Cegonha que recebe as mães solteiras e as mulheres vítimas de mal tratos, a empresa de inserção social “Jasmim”, que procura dar resposta ao 1.º emprego e a desempregados de longa duração, a escola profissional para pessoas portadoras de deficiência, a empresa “Tapete Mágico”, uma cooperativa de cinco pessoas com deficiência, que trabalham manualmente com teares, o CNO – Centro de Novas Oportunidades, na escola Bússola, onde cerca de 400 pessoas tentam completar as suas habilitações, com o propósito de uma promoção intelectual e social, a empresa “Espaço Verde”, onde se ensina e se fazem trabalhos de jardinagem remunerados, que visa a inserção social e profissional, a Casa da Paz, um espaço sócio-ocupacional para doentes mentais externos que nos procuram para passar o seu dia e ter alguma ocupação, o Jornal “A Candeia”, participamos no Micro-crédito, com um funcionário da Santa Casa, lá destacado, participamos na Comissão de Protecção de Jovens e Crianças, fornecemos apoio domiciliário simples integrado no ADIP. Penso que não me escapa mais nada… o que já não é pouco... temos também anexo à capela, temos um pequeno Museu, onde estão alguns documentos antigos, autênticas preciosidades. Encontra-se lá, um livro, muito interessante, chamado Livro dos Passantes, do século XVIII, onde ficaram registadas as pessoas que pediram ajuda à Misericórdia e onde podemos encontrar pessoas de quase todos os países da Europa. Esta Misericórdia é uma das mais antigas do país, já fez 500 anos. Apesar de ter sido uma Misericórdia pobre sempre aceitou ser remédio para quem a procurava.
Entre Vistas - Que tipo de auxílios presta a Santa Casa da Misericórdia de Albufeira?
Maria Helena Serra – A Santa Casa da Misericórdia de Albufeira procura dar resposta a todas as situações de infelicidade que atinjam as pessoas, procuramos diminuir e se possível apagar completamente todo o sofrimento humano.
Entre Vistas - Quem é que a Santa Casa da Misericórdia de Albufeira apoia? Quantas pessoas são apoiadas?
Maria Helena Serra – Todos as pessoas que precisam das valências anteriormente enumeradas. Por dia, nós servimos uma média de 500 pessoas.
Entre Vistas - Como é que sente quando ajuda as pessoas?
Maria Helena Serra – Sinto uma enorme felicidade quando consigo resolver os problemas que me são colocados. Chego a perguntar-me, se me sinto feliz porque consegui resolver o problema ou se porque resolvi o problema da pessoa.
Entre Vistas - É difícil lidar com os problemas do dia-a-dia?
Maria Helena Serra – É muito difícil. Lidar com problemas humanos não é a mesma coisa do que lidar com pacotes de açúcar bolos ou café.
Entre Vistas - Quais são os projectos para o futuro da Santa Casa da Misericórdia de Albufeira?
Maria Helena Serra – Os projectos são muitos, só que, infelizmente, o dinheiro não é nenhum… Nem sequer posso dizer que é pouco… Simplesmente, não existe dinheiro para se poder avançar para novos projectos. Tenho avançado com a força da fé que tenho. Sou uma mulher Cristã, com muita fé. Eu não digo Católica, digo Cristã. Cristão engloba tudo. A Santa Casa não tem opiniões políticas nem religiosas. Eu sou uma mulher com muita fé. Acredito que Deus não dorme. Está sempre acordado e virá em nossa ajuda. Tenho a esperança de colocar em funcionamento o velho hospital com cuidados continuados para os mais pobres.
Entre Vistas - Quando é que pensa abandonar o cargo de provedora?
Maria Helena Serra – Estará para breve porque a minha saúde já não é muita. A minha condição física já não me permite fazer tudo aquilo que eu pretendo, posso e devo fazer.
Entre Vistas - Qual é o seu maior sonho?
Maria Helena Serra – O meu maior sonho é de que, quem me suceder não deixe morrer a obra começada.

Maria Helena Santos Serra ao Raio X
Entre Vistas - Um brinquedo preferido?
Maria Helena Serra – Uma bola.
Entre Vistas - Música preferida?
Maria Helena Serra – Do compositor Chopin.
Entre Vistas - Livro que mais gostou de ler?
Maria Helena Serra – A Bíblia Sagrada.
Entre Vistas - O filme da sua vida?
Maria Helena Serra – Não tenho só um filme na minha vida. Tenho muitos filmes. Mas, há um que gostaria de destacar “O Carteiro”, de Pablo Neruda.
Entre Vistas - Prato de comida favorito?
Maria Helena Serra – Sopa.
Entre Vistas - Estação do ano preferida?
Maria Helena Serra – A Primavera.
Entre Vistas - Um dia especial?
Maria Helena Serra – O dia de Natal.
Entre Vistas - O que mais detesta?
Maria Helena Serra – A inveja, o cinismo e a mentira.
Entre Vistas - O que mais lhe dá prazer?
Maria Helena Serra – A verdade, a solidariedade e a paz entre todos
Entre Vistas - Um desejo?
Maria Helena Serra – Que o mundo se transforme num lugar de paz e de convívio, em que todos possamos ser de facto irmãos, como é o desejo e o sonho de uma grande maioria. Não é preciso sermos iguais é preciso é sermos irmãos.
Entrevista conduzida por Cristiana Ninhos e Miguel Correia
Guião da entrevista - produção colectiva 6.º D (2009/10)

segunda-feira, 1 de março de 2010

Entrevista ao declamador, escritor, actor e músico Afonso Dias

      Afonso Dias nasceu há 60 anos, em Lisboa, mas considera-se alentejano de coração. Veio viver para o Algarve em 1984. É um artista multifacetado, músico, cantor, escritor, poeta, contador de histórias, declamador, encenador e actor. Foi deputado à Assembleia Constituinte de 1974, pela UDP. Como músico, foi um dos fundadores, em 1974, do GAC – Grupo de Acção Cultural, com o qual efectuou inúmeras apresentações no país e no estrangeiro, assim como editou diversos discos. Ao longo da sua carreira integrou espectáculos com artistas como José Afonso e Sérgio Godinho, entre outros, tendo editado vários álbuns a solo. No âmbito do teatro, foi fundador, em 1999, da Trupe Barlaventina – Jograis do Algarve, com a qual realizou inúmeros espectáculos. Inicia em 2003, uma ligação de trabalho e cooperação com a ACTA (A Companhia de Teatro do Algarve) como encenador, actor, e cantor. Desde 2001, dinamiza nas escolas algarvias e de outras zonas do país, centenas de sessões de poesia.

Entre Vistas - Como é que se apaixonou pela poesia?
Afonso Dias – Tudo aconteceu muito cedo. Tanto quanto me lembro, ainda antes da entrada na escola Primária. A minha mãe gostava muito de cantar. Eu lembro-me de ser pequenito… e, ela me contar e cantar histórias. Julgo que tudo começou por aí... Na escola Primária, eu gostava muito dos poemas por causa da rima. A rima é uma espécie de música, ou música de facto. Julgo que foi muito cedo que me apaixonei pela poesia. Depois, comecei, mais a sério, a trabalhar com a poesia, por causa da música e do teatro, quando eu tinha catorze anos. A partir daí, foi sempre o construir de uma longa paixão.
Entre Vistas - Que poetas mais o influenciam?
Afonso Dias – Há uns quantos poetas que eu gosto especialmente. Não sei dizer bem, se me influenciam, ou não, na minha maneira de escrever poesia. Mas, eu gosto muito de poetas portugueses. Vou dizer-vos só uns quantos. Antes de mais, um poeta superior, Camões e depois, começando a viajar no tempo o Bocage, o Guerra Junqueiro, o Miguel Torga, a Sophia de Mello Breyner, o Alexandre O’Neill, o Eugénio de Andrade e para terminar a Natália Correia.
Entre Vistas - Que papel tem a música na sua vida?
Afonso Dias – A minha vida tem várias coisas com papéis principais, a minha família, os meus filhos, os meus netos… tenho alguns, os meus amigos, o meu trabalho. Tudo isto tem um papel principal. A música tem um grande papel na minha vida. Não consigo viver sem música.
Entre Vistas - É difícil viver de ser actor, em Portugal?
Afonso Dias – É difícil, mas creio que não é mais difícil do que noutros países. Há muitos actores que não conseguem ter trabalho regular. Por outro lado, os que conseguem ter trabalho regular, uns ganham muito mal, outros tem a felicidade de trabalhar em companhias que têm mais dinheiro e que lhes podem pagar melhor, outros têm acesso à televisão, vão a castings e depois são seleccionados e ganham melhor. É difícil… mas, se calhar é tão difícil como em qualquer outra profissão. É uma profissão instável.
Entre Vistas - Qual é a arte em que gosta mais de se exprimir?
Afonso Dias – Eu julgo que na poesia. Eu divido-me entre a poesia e a música. Mas, gosto muito das outras artes todas, da pintura, da escultura, do teatro, do cinema, da dança… eu acho que a poesia tem um papel igual nas artes todas. A poesia acaba por inspirar todas as outras expressões artísticas. Eu colocava a poesia em primeiro lugar.
Entre Vistas - Em Portugal, como é a vida de um artista?
Afonso Dias – É uma vida de trabalho. Quem trabalha nisto tem que se dedicar a isto, o tempo todo, como noutra profissão qualquer. Na minha área artística tem que se trabalhar muito, ou seja, tem que se ler muito, pesquisar muitas coisas, certos textos, certos autores, certas épocas, certas situações. No que diz respeito à música tem que se treinar muito. É um trabalho intenso como em quase todas as profissões.
Entre Vistas - Neste dia dedicado à poesia, que mensagem gostaria de transmitir aos jovens?
Afonso Dias – Aproveitem e descubram os segredos mágicos que a poesia tem… porque tem.

 
Afonso Dias ao Raio X

Entre Vistas - Um livro preferido?
Afonso Dias – É difícil escolher, mas vou destacar “A Montanha Mágica” de Thomas Mann.
Entre Vistas - Um autor ou uma autora preferido?
Afonso Dias – Sophia de Mello Breyner…poesia.
Entre Vistas - Canção favorita?
Afonso Dias – Isso é muito complicado, mas vou escolher “Era um Redondo Vocábulo” de Zeca Afonso.
Entre Vistas - O filme da sua vida?
Afonso Dias – Não tenho o “filme da minha vida”, mas posso destacar alguns. Vou destacar um mais antigo e um recente. O mais antigo é o “Shane”, um filme de cowboys, o mais recente é o “Mystic River”.
Entre Vistas - A cidade que mais gostou de visitar?
Afonso Dias – Praga, na República Checa.
Entre Vistas - A cidade que gostaria de visitar?
Afonso Dias – São Francisco, nos Estados Unidos.
Entre Vistas - Um dia especial?
Afonso Dias – O dia 25 de Abril de 1974
Entre Vistas - Maior virtude?
Afonso Dias – Ai isso eu não digo...
Entre Vistas - Maior defeito?
Afonso Dias – Teimoso. Sou muito teimoso.
Entre Vistas - Um desejo?
Afonso Dias – Que se cumprisse aquele preceito que diz que a falar é que a gente se entende. Porque se isso acontecesse, o mundo estava muito melhor do que está. Isso era o meu grande desejo, que nos entendêssemos só a falar. E que, vocês sejam muito, muito, muito felizes… bué…

Entrevista conduzida por Luís Cavaco, Mara Resende e Rodrigo Cardoso
Guião da entrevista - produção colectiva 6ºA (2009/10)